No que se atentar ao lidar com projetos envolvendo IA?

Minhas considerações para processos de design que envolvam essas tendências.

Beatriz Miranda
UX Collective 🇧🇷

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Imagem de capa de arte abstrata, com silhuetadas de padrões geométricos e desenhos coloridos, intrincados e emanando de suas cabeças, simbolizando pensamentos e/ou emoções complexas.
Imagem gerada com IA — Copilot | Designer

Você deve estar com cansaço de saber que a IA é o novo pop, mais do que o Vogue da Ariana Grande. Todo mundo ouve, todo mundo quer, todo mundo se anima com isso! Mas francamente tem me sido uma jornada pra lá de ansiosa lidar com esses cenários, só que vou deixar o choro de pitangas em off e agora, me sentindo mais entendida no assunto, vou compartilhar com você a minha visão de designer de produtos sobre.

Dando um panorama breve

Quando falo em tendências atuais, estou me referindo, em resumo, a ampla adesão na ideia de integrar a IA cada vez mais no nosso cotidiano, em processos e rotinas, por vezes envolvendo uma IA com comportamento similar ao do ser humano, basicamente o que vemos no já consagrado ChatGPT da OpenAI, na Copilot da Microsoft e Gemini (ex-Bard) da Google, por exemplo.

Mas faz bem ressaltar que Inteligência Artificial não é um tópico novo.

Essa parada é estudada há décadas e muita coisa no nosso dia a dia já utiliza técnicas da área. Por isso reitero a ideia de que virou pop, porque agora a massa está usando de forma cada vez mais direta — e isso é positivo! Muitas coisas estão surgindo a partir dessa maior acessibilidade ao tema. Dito isso, sigo para minhas considerações:

Mais do que nunca: focar na pessoa usuária

Imagem com quatro pessoas unidas, com rostos obscurecidos, em um fundo verde claro. Vestem roupas casuais e demonstram apoio mútuo. Imagem do Freepik
Pessoas reais. Imagem do Freepik

Muito do que se vê é o desejo de aplicar IAs só para seguir a onda, às vezes tentando se adequar a alguma expectativa do mercado, mas sem identificar se trará algum benefício ao público-alvo de fato. Mas essa novela não é de hoje, né? Meu corpo envelhece 1% toda vez que me deparo com o esquecimento da pessoa usuária. Paciência.

Mas não é pop se não atrai. Sem conhecimento do benefício, é só mais uma funcionalidade bonita lá que deu um trabalhão pra fazer, não há interesse, não há engajamento e potencialmente não há lucro. Não adianta só chamar de “[insira-nome-aplicativo] + AI”. Muita gente não sabe nem pra onde vai essas coisas.

Se você mostrar uma funcionalidade tecnológica qualquer e dizer que é uma IA (feita/construída/dirigida por Tarantino), há pessoas que vão acreditar sim, mas não vão entender no que isso as convém. Então é vazio trabalhar achando que todo mundo vai saber de imediato porque aquela aplicação e/ou funcionalidade com IA é super interessante.

Então é preciso focar nos benefícios. Em vez de: “utilizamos a técnica X, Y e Z de Inteligência Artificial (…)”, vem com o que interessa: “nossa atualização faz sua rotina de tal coisa acelerar em 300% porque você vai parar de fazer N coisas (…)”. Vidas leigas importam.

Afastar ideias de tapa buraco

Imagem representando o céu estrelado escuro, com linhas brancas criando um efeito de túnel.
Porque o buraco continua existindo. Imagem do Freepik

Sistemas tem problemas, às vezes tem problemas há anos e não é a pobre IA-Pop que vai resolver tudo. Mas podem achar que vai e é aí que mora o perigo.

Por exemplo, você está com uma demanda de acrescentar uma nova funcionalidade para tornar as rotinas do seu sistema mais produtivas. No meio do caminho, as pessoas usuárias reclamaram que o sistema tem problemas em notificar erros e que isso atrapalha a rotina que é o seu foco. Isso envolve IA? Grande chance. Mas eis a questão: isso deve entrar no escopo da sua demanda?

Falando assim, parece meio óbvio que não é ideal entrar, afinal, seu objetivo no momento é outro. Mas ali nas discussões pode acabar sendo visto com bons olhos resolver ambas as coisas numa cajadada só. Ou seja, usar uma funcionalidade alheia para resolver uma questão que, considerando boas práticas, deveria ser tratada e trabalhada de outra maneira, inclusive apartada.

Vou dar outro exemplo: a pessoa usuária não preencheu campos que eram obrigatórios em um formulário. Não soube identificar quais eram e assim foi impedida de ir para a próxima etapa do fluxo. Considerando esse cenário, vou criar um chatbot com IA Generativa, que também leia a tela e diga à pessoa usuária onde estão os campos a serem preenchidos. Percebeu o problema?

Eu trouxe algo novo para resolver um problema que é… na falta de transparência de problemas nos campos. Talvez também falta de clareza das mensagens de erro nos campos, falta de proximidade deles aos campos. Eu precisava mesmo reinventar a roda?

Chamo essas coisas de ideias tapa buraco porque é o que é: trazer algo além para resolver um problema que, na verdade, prosseguirá existindo em outra camada da interface. Criei um Frankenstein, praticamente.

Muitas coisas podem ser feitas ou resolvidas utilizando IA, mas nem tudo precisa de uma IA avançada, uma IA básica ou sequer precisa. Pratique o pensamento enxuto, OK?

Pautar transparência e segurança

Um homem em pé no pico de uma montanha, contemplando uma vasta paisagem de colinas iluminadas pela luz dourada do sol.
Assim facilita adentrar às possibilidades. Imagem de vecstock no Freepik

Não dá para trabalhar com IA sem ética. Precisamos ressaltar os riscos, se houver, tanto ao time quanto à pessoa usuária durante a experiência do uso, e isso está interligado diretamente a apresentar transparência no processo.

Então se for necessário inserir um Disclaimer, dar mais exemplos, fazer um tour, enfim, o faça. É ideal que a pessoa usuária tenha todas as informações que precisa ao utilizar a aplicação, portanto também use uma linguagem clara sobre os objetivos da proposta. Ressaltar riscos interliga prevenir erros, o que também é importante de ser abordado no processo de design.

Contudo, nem tudo sendo flores, é também considerar que tudo pode dar errado. Assim sendo, quando você imaginar as jornadas, considere o que deverá ser feito quando a coisa quebrar. Métodos de reverter, como fazê-los e como isso aparecerá para a pessoa usuária, como tranquilizá-la ou deixá-la informada sobre os próximos passos, etc.

Inclusive tudo isso deve ser decidido e alinhado com todos os envolvidos na proposta. Aqui só estou querendo ressaltar que não se trata de uma premissa apenas para a pessoa designer. Se a coisa der ruim, a responsabilidade é de todas as pessoas envolvidas na proposta.

Para consolidar bem essas premissas que comentei, vou te apresentar um framework chamado Vilas — que leva o nome do seu criador Vilas Dhar, autoridade no assunto de ética em IAs — que trata o que seria uma estrutura ideal de ética no uso de IAs. Ele possui 3 pilares que resume tudo passado acima:

1) Práticas responsáveis sob os dados (Responsible data practices)

É sobre tentar, ao máximo, diminuir o viés sob os dados que serão utilizados para treinar/direcionar a aplicação. De onde tiro esses dados? Fazem sentido ao propósito? É algo que você pode propor ou observar como está ocorrendo durante as tratativas com o time.

2) Limitações para uso apropriado e seguro (Boundaries on safe and appropriate use)

É próximo do que já tendemos a analisar como designers: quem é nosso público, suas dores, necessidades. Aqui friso sobre como fazer a coisa acontecer da melhor maneira possível, da forma mais responsável e segura.

3) Transparência robusta (Robust transparency)

Também é sobre quão claro o processo está para a pessoa usuária. Ela entende de onde sai e para onde vai? As formas para fazer isso acontecer são diversas.

O que mais pode ser feito

Busque entender como auxiliar no aumento dos dados

Para a atuação da IA, dados são ouro. Mas como inserir isso na experiência do usuário? Como fazer isso sem diminuir a qualidade da experiência? Aí é contigo mesmo.

Busque saber quais serão as técnicas de IA utilizadas

É aí que você começa a tomar conhecimento da sopa de letrinhas e expressões do contexto da aplicação e, sim, se aprofunde neles.

Dependendo do que será utilizado, você já terá ideia do rumo da demanda. Mas sempre bom verificar o que o time de tecnologia tem em mente (e já usá-los a seu favor para tirar dúvidas, se existirem).

E se você já estiver craque na disciplina, sugira as técnicas que façam sentido para a evolução do produto, projeto, sistema, etc. Inclusive eu diria para você fazer isso em qualquer momento, não só quando está lidando com algo atualmente. rs

Documenta tudo pelo amor de Deus

É tudo o que te peço. Essas coisas são delicadas, então tenha ali um carinho, documente e deixe disponível para todas as pessoas envolvidas.

A forma mais fácil de aprender, é na prática

Além das que citei lá no começo, há trocentos modelos de IA por aí para você desbravar e, inclusive, utilizar no seu próprio processo de design. Usar esses sistemas lhe dará mais ideia de como eles funcionam.

Aqui concluo meus centavos sobre o assunto. Obrigada por ler! E um lembrete:

IA não é tendência. As tendências são os assuntos em torno dela que variam conforme o tempo. Ou seja, mudam em relação a ela, não por cima dela.

Então bora se aprofundar e começar a utilizar dos inúmeros benefícios na nossa rotina com o uso delas — no trabalho e na vida.

Se quiser papear mais sobre, deixo disponível meu LinkedIn.

Até a próxima!

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